por Paulo Machado*

Em 2011, a missão de levar sabores verde-amarelos foi ao Quênia, a convite da embaixada do Brasil em Nairobi para o evento First Brazil in Eastern Africa EXPO 2011, para o qual preparamos jantares durante uma semana no seleto Sarova Stanley Hotel. Um dia após minha chegada, visitei mercados para identificar os ingredientes para preparar bobó de camarão, barreado, feijoada, arroz carreteiro, guisado de bode, quindim, brigadeiro e outras delicias tupiniquins. Achei tudo, ou melhor, quase tudo. Para o meu espanto, ali na África Oriental, o azeite de dendê não é utilizado na cozinha. Pior: no Quênia não existe sequer a palmeira do dendê. Só então me dei conta que o azeite tão querido de nossa Bahia veio do lado Ocidental da África, de países como Angola e Moçambique. Tive que usar o plano B: a moqueca da Bahia virou capixaba, o vatapá se tornou do Pará, e o bobó, enfim… Troquei por caribéu, delicioso guisado pantaneiro que também leva a mandioca.

Ao contar para o chef do hotel o novo menu, ele ficou entusiasmado exceto pela “cassava”. No Quênia não é de bom tom servir mandioca em restaurantes finos, pois é uma comida de subsistência. Pessoas mais nobres podem até comê-la, mas escondidas. Para se ter uma ideia, a família real é proibida de degustar a iguaria. Achei tudo aquilo muito estranho, lembrei inclusive de quando a cachaça sofria preconceito no Brasil e hoje já é, por muitos, motivo de orgulho nacional.

Passei a noite pensando numa solução, preocupado, como iria cozinhar sem mandioca: não posso fazer caribéu com batata inglesa e o escondidinho ficaria terrível. Enfim, a solução: “Podemos substituir o termo ‘cassava’ por ‘manioc from Brazil’?”. O chef queniano aprovou o novo termo com um sorriso. O mais bonito foi ver o prazer dos comensais ao longo daquela semana lambendo os beiços com iguarias brasileiras feitas com a rainha do nosso País.

* Texto publicado na coluna da Terra Estrangeira, da edição 214