Nesta sexta-feira, 25 de outubro, comemora-se o Dia Mundial do Macarrão (World Pasta Day), instituído em 1995 no Congresso Mundial de Pasta, em Roma, na Itália. Em série especial sobre a data, o site Revista Menu entrevistou três chefs para contribuir com o diálogo de “mitos e verdades” sobre a culinária italiana.

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À reportagem, Floriano Pellegrino Jr., eleito em 2023 o 84º melhor chef do mundo pelo The Best Chef Awards, inicia: “Não há ideias preocupantes em relação à culinária italiana, exceto pelo fato de que há uma ignorância generalizada. Isso é preocupante”.

“Ser defensivo em relação a uma verdadeira cozinha italiana faz sentido, mas não ser ignorante e entender que a tradição é uma inovação antiga. A tradição também foi uma evolução de algo que não existia. Em certas coisas, devemos ser rigorosos, em outras, nem tanto”, comenta Floriano, proprietário do restaurante Bros World em Lecce, na Itália.

‘Defensores do clássico’ — mas não das regras imutáveis

Em bate-papo com o site, o chef Roberto Ravioli, vice-presidente nacional da Federação Italiana de Chefs (FIC Brasile), reconhece — e defende — a existência de um “clássico”; mas não descarta o valor das inovações: “A gente preza pelas receitas clássicas. Mas claro que hoje em dia, entre custo-benefício, criatividade e todos esses ‘pseudo-chefs’ que estão saindo, a cozinha, até mesmo na Itália, já está mudando muito”, começa.

E completa: “Nós somos defensores do clássico. Mas não é que não pode fazer [inovações]. Evidentemente, você pode fazer. Eu, particularmente, acho que na gastronomia você não tem que ter tanta rigidez. Acho a liberdade muito bem-vinda”.

Floriano, por sua vez, entende que muitas das receitas consideradas típicas da Itália são relativamente jovens. Apesar disso, ele ainda reconhece a tradição: “Dentre as coisas sobre as quais devemos ser rigorosos está a qualidade dos ingredientes. Podemos dizer que padronizamos certos tipos de situações e nos orgulhamos disso. Mas somos conscientes de que a culinária italiana, ou pelo menos a culinária italiana que temos agora, surgiu após a Segunda Guerra Mundial”.

E o chef Antonio Maiolica, natural de Salerno e residente no Brasil há 10 anos, complementa: “É uma culinária realmente ainda está crescendo. Ela está sendo melhorada. Mas comida não é para brigar, entendeu? Cada um come do jeito que ele quer“.

“Em casa, come do jeito que você quer. Agora, no meu restaurante, eu gostaria de fazer de um jeito para você apreciar, do jeito que eu acho correto” — Antonio Maiolica, do Temperani Trattoria e Temperani Cucina, em São Paulo.

Macarrão e molho

Em termos técnicos, o chef Roberto enfatiza a importância da massa “al dente”, bem como:

  • Nunca passar a massa em água fria — “jamais lavar as massas”, como adverte o chef;
  • Nunca por óleo, azeite ou qualquer tipo de gordura na panela de macarrão;
  • Utilizar cinco litros de água pra meio quilo de massa;
  • Para essa proporção, adicionar uma colher de sopa de sal.

“A água tem que ter gosto de água do mar, que é salgada. E por que tem que ser muita água? Porque a massa tem que ficar mexendo ali. As pessoas põem óleo para a massa não grudar, mas é o erro. Quando a massa fica oleosa, fica escorrendo água, e o molho não adere direito”, adverte.

Para o especialista, a harmonização da massa com o molho é de suma importância para o sucesso do prato. Ele recomenda:

  • Massas curtas: são as melhores opções para molhos com peixes e crustáceos;
  • Pappardelle: harmoniza com proteínas como javali, faisão, codorna e ragu;
  • Rigatoni, paccheri: podem ser apreciados com molho de tomate e ragu de linguiça;
  • Orecchiette: combina com verduras e legumes como brócolis e azeitonas;
  • Espaguete: para o chef, é alho e óleo — e “não tem conversa”.

Até os queijos têm um limite

O brasileiro não tem limite, esse é o problema do brasileiro. É exagerado“, comenta o chef Antonio, a respeito do uso desenfreado de queijos na culinária. Sobre o tema, ele e Roberto concordam: há limites.

“Colocar queijo no peixe, acho ‘nada a ver’. Mas tem uns pratos que, na Itália, levam queijo. O italiano fica muito bravo, mas eu já comi, na Itália, cacio e pepe com camarões. Já comi, na Itália, mozzarella de búfala com tartar de atum. A combinação de queijo com peixe tem que saber fazer”, completa o italiano.

E Roberto observa: “Na Itália, quando você pede o queijo, a pessoa fala: ‘Mas já tem queijo. Não tem necessidade’. No meu restaurante, os caras pegam potes e potes de queijo. Claro que o queijo é gostoso, mas onde é que vai bastante queijo? Em um belo spaghetti al burro e formaggio, com manteiga e queijo. Aí vai!”

Um ‘amor visceral’

Por fim, o chef Floriano enfatiza que as “diretrizes” não devem ser maiores, finalmente, do que o amor pela culinária italiana.

“Mais do que regras, existe um código não escrito da cozinha italiana, que está ligado a uma cozinha regional — que tem raízes jovens mas, ao mesmo tempo, muito antigas. A única regra é que aqui temos um amor visceral pela nossa cozinha; e isso talvez seja a diferença em relação à maior parte do mundo: somos obcecados pela comida. Poucos no mundo compartilham isso conosco, talvez dois ou três além de nós”, finaliza.