por Suzana Barelli

A sommelière argentina Paz Levinson é a profissional latino-americana de maior sucesso na Europa. Em uma carreira que começou em 2003, no restaurante Restó, na Argentina, esta sommelier certificada com o diploma avançado da Court de Masters Sommeliers, alçou voo: trabalhou nos Estados Unidos, na Inglaterra, onde teve a honra de estar junto de Gerard Basset, uma unanimidade entre os profissionais desta área, falecido recentemente; na China, entre outras moradas. Acabou escolhendo Paris para fincar bandeira. Na cidade ícone para as grandes harmonizações gastronômicas, ela trabalhou em restaurantes com três estrelas Michelin, como o Le Bristol. Atualmente, Paz é a principal sommelier do Groupe Pic, com restaurantes na França, na Suíça e na Inglaterra e só tem elogios para a chef Anne-Sophie Pic. A sommelière também coordena o time dos jurados dos vinhos argentinos no Decanter Wine Awards, um dos mais respeitados concursos de vinho da atualidade.

Na entrevista a seguir, realizada por e-mail, ela conta que nem sempre é fácil ser mulher neste ambiente do vinho. Acompanhe.

Atualmente você trabalha em um grupo chefiado por uma mulher, a chef Anne-Sophie Pic. Na sua opinião, quais são as vantagens de uma liderança feminina?
Há muitas vantagens para mim porque é uma chef com quem eu posso falar. Isso não é o caso de vários restaurantes de alta gastronomia. Às vezes, o chef e o sommelier não falam o suficiente. Para mim, isso é tão importante. Anne-Sophie é uma mulher, mas também tem uma personalidade que eu gosto muito. Eu posso falar, expressar, aprender, ensinar ao lado dela. Ela é compreensiva e entende até onde eu gostaria de ir, nos objetivos e nos sonhos.

Existem diferenças entre trabalhar em um restaurante dirigido por um chef e uma chef?
Para mim, há muita diferença. Na minha vida, trabalhei em dois restaurantes com chefs masculinos. No primeiro, na Argentina, houve muitos comentários sexuais. E isso era comum, habitual. Piadas de todos os tipos. Dito isto, o chef nunca tocou em ninguém. Era apenas com palavras e ele era como um “bad boy”. Na França, eu falava muito pouco com o chef e essa foi uma das razões pelas quais resolvi sair. Eu não posso trabalhar em um restaurante sem diálogo, sem trocas. Era muito complicado para um francês que só fala francês e se sente mais à vontade falando com homens. Então todas as minhas experiências foram com chefs mulheres. Eu fui abençoada desde o começo com Maria Barrutia (restaurante Restó, na Argentina), que me encorajava a trabalhar, a aprender e ser melhor. Uma mulher que encoraja e ajuda a outra. Eu sou quem eu sou por causa deste começo. Depois, eu trabalhei com a Chiho Kanzaki (restaurante Virtus, em Paris). Poderíamos trabalhar mais juntas, eu amo tanto sua paixão e precisão e a maneira como ela trabalha com seu parceiro na vida e nos negócios, o Marcelo Di Giacomo. Agora com Anne-Sophie é um sonho tornado realidade. Ela me encoraja, nós compartilhamos muitos momentos especiais. Nós amamos falar sobre harmonizações e novas ideias e nós duas adoramos coquetéis.

Na sua opinião, o que define um vinho feminino? E um vinho masculino?
Eu não uso essas expressões. Eu não acho estas expressões claras e não gosto quando as pessoas descrevem um vinho assim. Quer dizer, todos os vinhos florais, leves e frutados são femininos? Não consigo entender. Há diferentes formas de feminilidade, pois existem muitas formas de masculinidade. Então eu costumo não usar essas palavras como descrição de um vinho.

No trabalho de sommelier, há diferenças no trabalho de homens e mulheres?
Sim e elas aparecem de várias maneiras. Eu trabalho com homens e mulheres, mas existem diferenças principais. Acho que as mulheres são muito analíticas e ouvem o que os clientes pedem de maneira diferente. Há mais precisão em satisfazer o cliente. Claro que estou falando de uma maneira muito geral, mas acho que as mulheres têm uma leitura mais instintiva sobre a dinâmica da mesa onde ocorre a refeição. Outra diferença é na adega. Posso ver quando uma mulher é a responsável. O ambiente é muito mais limpo, e há uma ordem lógica em tudo. Os homens deixam a adega a sua maneira e os outros têm que aprender onde está cada vinho. As mulheres colocam números, classificam, fazem mapas da adega. Elas são muito didáticas.

Como os clientes do restaurante respondem ao serviço de sommelier oferecido por uma mulher?
Depende de qual país e que estilo de restaurante. Em um restaurante três estrelas em Paris, os clientes gostam mais de serem servidos por homens do que por mulheres. Eu tive alguns episódios em que o cliente ligou diretamente para um homem. Quanto mais clássico e caro for o restaurante, eu acho que os clientes mais querem ver um homem no salão. Em restaurantes modernos, com uma estrela Michelin, mais casuais, os clientes são mais abertos. O que é difícil é quando é uma mulher estrangeira. Os franceses não confiam tanto. Eles acham que os estrangeiros não podem conhecer o vinho francês como os franceses.

Quais conselhos você daria para que as mulheres terem sucesso no mundo do vinho?
Trabalhar em lugares onde há tutores ou mentores. Trabalhar com boas pessoas, que estimulam o conhecimento e que as mulheres continuem aprendendo. E trabalhar com bons chefs, que permitam o dialogo, sem violência de nenhum tipo.