por Paulo Machado*

Em 2013, o chef confeiteiro Thiago Bettin e eu embarcávamos com as malas cheias de ingredientes brasileiros rumo à Tailândia, terra da gastronomia de rua mais fresca e farta do planeta. Era o segundo ano consecutivo em que comandávamos o Festival de Cozinha Brasileira, que dessa vez aconteceu na rede de hotéis Centara em Bangkok, Pattaya e Ko Samui.

Assim como a primeira edição, foi um evento incrível, com direito a caipirinha, bobó de camarão, atolado de bode e picanha de sol. Mas o jantar oferecido para um seleto grupo no restaurante Fifty Five, do principal hotel da rede, na capital tailandesa, teve uma surpresa. Amantes de chá que são, lhes ofereci a erva-mate, tomada em guampa e bomba (como no Pantanal, com um copo de chifre e canudo infusor de metal). A ideia era que cada mesa, com quatro a seis pessoas, compartilhasse o tereré, ritual típico de minha terra natal, Mato Grosso do Sul. A experiência completa, de encher a bebida com água gelada, tomar e passar adiante, foi das mais bem recebidas e surpreendentes.

Na nossa primeira ida, em 2012, já havia notado quantas semelhanças existiam entre as cozinhas tailandesa e brasileira, mesmo tão distantes no globo. Lembro-me de ter levado muita chicória do Pará (o coentrão), escondida no fundo da mala, para conseguir fazer o pato no tucupi e outros preparos típicos. Mas vi que minha preocupação foi à toa quando encontrei a erva aos montes no país, chamada de “phak chi farang”, usada em muitos caldos. As sobremesas não são tão açucaradas quanto as brasileiras, mas uma receita tradicional lembra bastante nosso pudim de leite ou o manjar de coco – algo que se deve à influência de portugueses que passaram por lá. Só que, no lugar da forma, o doce é preparado dentro de uma moranga, que é levada ao forno e servida em fatias com o pudim.

No festival, mantivemos nossas raízes bem açucaradas e oferecemos doces como brigadeiro, romeu e julieta e bolo de rolo. Todos aprovaram! E, sabendo que a pimenta fala alto na cozinha tailandesa, reforcei o tempero nos nossos pratos tradicionais e ainda fiz molho com cumari, bodinho e malagueta, para mostrar nossas variedades ardidas.

Já uma grande diferença entre nossas culturas que me surpreendeu foi o cupim. A peça geralmente é descartada – por ser bem gordurosa e eles não consumirem tanta carne bovina quanto nós. Mas quem sabe, em um próximo evento, o cupim à brasileira possa ganhar o gosto dos tailandeses?

* Texto publicado na coluna Terra Estrangeira, da edição 217 (maio/2017)