Originalmente: Está bonita a festa cervejeira portuguesa, pá

Por Roberto Fonseca

“E qual a melhor cerveja de Portugal?” A pergunta, feita no fim de 2017 por um senhor da imigração portuguesa, já na casa dos seus 60 anos, desconcertou o que era para ser um quebra-gelo típico que eu utilizo em viagens, ao explicar que visito algum país para conhecer suas cervejarias artesanais. Até então, minha experiência com produções locais se resumia a algumas cervejas provadas em Lisboa e Porto em 2013, mas ainda sem grande brilho, e outras tomadas em São Paulo, durante visita de produtores lusitanos.

Os três dias seguintes mostrariam que a cena cervejeira portuguesa evoluiu muito nesse intervalo. A facilidade em abrir uma cervejaria, segundo produtores locais, tem seu lado bom e ruim, ao estimular o surgimento de novas empresas e ideias, mas também produções sem consistência e com problemas. Um cenário bem parecido com o do Brasil de alguns anos atrás. As marcas portuguesas, porém, já começaram apostando bastante em um aspecto local para suas receitas, com ingredientes típicos – uva, castanha e a ginja, cereja usada em um tradicional licor lisboeta – e barris de vinho dos mais diversos tipos.

Uma delas é a Mean Sardine, atualmente uma cervejaria cigana – sem fábrica. Ela tem dois brasileiros em sua equipe: Marcos Praça e Daniel Ramiro, que já trabalharam na piracicabana Cevada Pura. A marca tem em sua lista de receitas Imperial Stouts com ingredientes locais, como a Ginja Ninja, que leva licor de ginja e foi feita em parceria com a holandesa De Molen. Em abril, alguns rótulos da Mean Sardine, da Letra e da Post Scriptum devem chegar ao Brasil, trazidos pela importadora Skilser.

Em Lisboa, quem se interessa por cervejas tem duas paradas obrigatórias: uma delas é a Cerveteca, bar que reúne boa quantidade de rótulos locais. Vale procurar por alguns mais difíceis de se encontrar, como a Brett Aged da Luzia, fermentada em carvalho com Brettanomyces, com notas rústicas e de celeiro bem destacadas. Também há o brewpub da Dois Corvos, com uma dúzia de torneiras – chamou a atenção a potente Scotch Ale Into the Woods – e algumas opções em garrafa.

A curta estadia mostrou que a cerveja portuguesa evoluiu muito, e tende a fazê-lo ainda mais. Resta, porém, um desafio similar ao brasileiro: convencer o público. O senhor da imigração do começo do texto, depois de ouvir alguns palpites meus sobre qual poderia ser a melhor cerveja local, resignou-se: “Para mim é a Sagres”, disse, referindo-se a uma das marcas industriais portuguesas mais famosas.