Abrir uma garrafa de vinho, despejar seu conteúdo em uma taça e apreciar os sabores daquele rótulo é uma tarefa relativamente simples — e presente no cotidiano de milhões ao redor do mundo. Acompanhar o processo que antecede o envasamento da bebida, no entanto, é um privilégio para poucos. Quem teve a oportunidade de participar dessa atividade foi a chef Elisa Fernandes, que compartilhou, com exclusividade à Revista Menu, detalhes de sua visita à vinícola Dorli Muhr, na Áustria. 

No final de setembro, a chef fez um “intercâmbio” na cidade de Prellenkirchen para acompanhar o início da vinificação. O processo começa na colheita das uvas: investindo em pessoas em detrimento de máquinas, a vinícola usa funcionários para colher manualmente os cachos e remover as uvas impróprias para a vinificação.

Parte das uvas colhidas passa pela desengaçadeira, máquina que separa os bagos (frutos) do engaço (talo). A partir daí, os métodos de fermentação podem variar.

Métodos de fermentação das uvas

Elisa explica que os métodos de fermentação diferem principalmente na forma como lidam com o engaço e a intensidade da extração, o que leva a perfis de sabor distintos nos vinhos. São eles:

Pisa das uvas com engaço

O processo de pisa dos cachos ainda com o engaço dura entre três e quatro quatro dias. A rapidez tem relação com o perfil final desejado nos vinhos: o talo aporta frescor e incorpora taninos delicados ao vinho. Apesar disso, se o engaço permanecesse até o final da fermentação, os níveis de álcool seriam muito intensos, comprometendo a delicadeza da bebida. Após o rápido período inicial, o engaço é removido e as uvas seguem fermentando.

Fermentação manual sem engaço

Esta técnica foca na extração dos bagos da uva, que são amassados delicadamente com as mãos, resultando em uma extração menos intensa. O processo envolve mexer nas uvas somente uma vez ao dia, o que resulta em um perfil majoritariamente frutado ao vinho.

Fermentação em camadas sem engaço

Sem pisa ou contato manual, este método se baseia no próprio peso da uva e na redução do contato com o oxigênio. As uvas sem talos são dispostas em camadas, uma em cima da outra, de forma a reduzir o oxigênio entre cada bago. O próprio peso da fruta promove uma extração delicada e com menos incorporação de oxigênio ao suco.

Envelhecimento em barricas

Após seus períodos de fermentação determinados, as uvas vão à prensa, onde têm suas impurezas e resíduos coados. O líquido segue, então, para ser bombeado aos barris, que têm seu conteúdo analisado um a um. Uma vez aprovado nos testes, o conteúdo segue fermentando nas barricas.

Ao longo do envelhecimento, o conteúdo da barrica passa por constantes análises: para medir densidade, temperatura e até mesmo o pH do líquido; além de ter sua fermentação monitorada. Após ao menos um ano de envelhecimento nas barricas, inicia-se a feitura dos primeiros blends — “para criar as ‘receitas’ de cada rótulo”, conforme explica a chef. Antes de chegar à taça, a última etapa: além das barricas, o líquido envelhece por mais um ano na garrafa. 

Dorli Muhr

Dorli Muhr é uma produtora de vinhos austríaca que iniciou sua carreira no setor como tradutora e fundadora da Wine&Partners, agência de marketing e comunicação especializada em vinho e gastronomia. Em 1995, decidiu retomar a tradição familiar e replantou terras da família no Spitzerberg, região vitivinícola próxima a Prellenkirchen, no leste da Áustria.

A produção começou em 2002, em parceria com seu então marido, Dirk van der Niepoort. Juntos, expandiram gradualmente os vinhedos e fortaleceram a vinícola, que ficou conhecida como Weingut Muhr-van der Niepoort. Após o fim da sociedade, Dorli assumiu integralmente o projeto, hoje conduzido sob seu nome. A vinícola segue com sede em Prellenkirchen, onde ela vive com a filha Anna.