07/10/2019 - 16:00
por Suzana Barelli
O Marquês de Borba Reserva é daqueles tintos que ajudaram a escrever a história do Alentejo português na procura por um lugar de destaque no mapa dos vinhos de qualidade. Desde 1997, quando foi elaborado pela primeira vez, até as safras atuais (hoje a 2014 é comercializada no mercado brasileiro pela Casa Flora e pela Porto a Porto por R$ 540), o tinto conta esta caminhada de uvas, vinhedos e enólogos por um novo perfil de brancos e tintos alentejanos.
Seu enólogo é o português João Portugal Ramos, que esteve no Brasil para conduzir uma prova vertical com oito safras deste tinto. Portugal Ramos é um pioneiro no Alentejo. Começou no início dos anos 1980 e teve um importante papel em também trazer qualidade para os vinhos elaborados pelas cooperativas alentejanas. No Alentejo, a união de produtores em torno de uma cooperativa é uma realidade desde o governo de António Salazar (1989-1970) e Portugal Ramos deu consultoria para elas.
Dez anos depois de formado, em 1990, o enólogo decidiu plantar os seus primeiros cinco hectares de vinhedos em Estremoz e começar o seu projeto pessoal – hoje, ele administra cerca de 1 mil hectares em quatro regiões de Portugal, 40% deles arrendados com contratos de parceria com os produtores. “Sempre acreditei no potencial de Borba para os vinhos de qualidade”, conta o enólogo. Os primeiros vinhos próprios de Portugal Ramos nasceram em 1992. Em 1997, o enólogo inaugurou sua própria vinícola, a Adega Vila Santa, em Estremoz. É uma construção que mescla a tecnologia de vinificação (como os tanques e os controles de temperatura) com a tradição portuguesa, como os lagares. Até hoje, as uvas para os vinhos premium são pisadas em lagares.
O Marquês de Borba Reserva nasceu em 1997, na estreia da vinícola, e só é elaborado em safras em que as uvas trincadeira, aragonês, alicante bouschet e cabernet sauvignon atingem a qualidade almejada. Nesta história, o tinto não foi elaborado em sete safras. “E já sei que não terá Marquês de Borba em 2018”, conta Portugal Ramos.
A primeira safra provada, a de 1999, já revela o empenho dos enólogos alentejanos em busca de qualidade. Na taça, o tinto se mostrou ainda com algumas notas frutadas, com muitos aromas de evolução, com frutas secas, notas balsâmicas, além de café torrado, envoltos em taninos macios e muito potente. É resultado de uma decisão do enólogo de estagiar por duas vezes em barricas novas, o chamado 200% de barrica. “Quando eu provei o vinho nas barricas, ele parecia sem madeira e decidi deixá-lo novamente em novas barricas”, conta Portugal Ramos. O conceito de 200% de barrica foi uma técnica muito utilizada na virada do século, mas que vem perdendo força. As safras mais atuais do Marquês de Borba Reserva nem passam 100% em barricas de carvalho novo, na tendência de diminuir a presença da madeira no vinho.
Da primeira década do ano 2000, foram provados quatro vinhos: 2003, 2007, 2008 e 2009. Neste período, o enólogo reduziu a elaboração deste vinho de 50 mil garrafas em média por safra para as atuais 15 mil garrafas. Neles, o aprendizado mais visível foi do uso da cabernet sauvignon, a única variedade não francesa que entra no blend do Marquês de Borba. A alicante bouschet, apesar de francesa, é uma uva que se adaptou muito bem no Alentejo, ao contrário da França, e permite a licença poética de ser considerada portuguesa. No 2003, diz Portugal Ramos, o segredo é o cabernet sauvignon, que amadureceu bem, sem a sobre maturação neste ano tão quente na Europa. “Nunca utilizo mais de 20% de cabernet neste blend, mas nesta safra é o cabernet que garante a longevidade do vinho”, conta o enólogo. O 2007 é um vinho elegante, com taninos presentes, aveludados e bom frescor final, em perfil bem semelhante ao 2009, que estava mais frutado. O 2008 difere um pouco do perfil dos demais, e Portugal Ramos diz que a causa é a cabernet sauvignon, que não amadureceu bem no ano. “Quase não elaborei o Marquês de Borba neste ano”, conta. É a safra com menor porcentagem de cabernet, menos de 5%.
Nos anos 2000, o enólogo também deixou de lado as consultorias e focou apenas nos seus projetos pessoais. Além do Alentejo, ele elabora vinhos em Beira, no Douro e, mais recentemente, na região de Vinhos Verdes. Dos vinhos Marquês de Borba da década de 2010, o aprendizado é nos detalhes, em saber lapidá-los. De todos, o 2011 foi o mais elegante, com aromas de frutas vermelhos, especiarias, balsâmicos, e taninos presentes e muito sedosos e muito persistente; o 2012 seduz pelos aromas frutados e pela redondeza no paladar. O 2014 ainda está muito jovem, pedindo tempo em garrafa para mostrar o seu potencial. “O 2015 é bastante promissor”, adianta o enólogo sobre a próxima safra que deve chegar ainda este ano no mercado.