29/07/2019 - 20:00
Por Roberto Fonseca*
Apesar de a temperatura favorecer mais as Sours, a Flórida (EUA) tem também bons produtores de cervejas escuras e mais “parrudas”, algumas das quais entre as principais representantes mundiais do estilo Imperial Stouts.
Para quem não conhece, as Imperial Stouts proporcionam uma primeira impressão marcante. Naturalmente alcoólico e complexo em termos de maltes e ésteres, o estilo sobe ainda mais algumas notas com exemplares maturados em barris de bourbon, uísque ou outros destilados. E com a adição de ingredientes como lactose, canela, baunilha, café, coco, frutas vermelhas e quetais. Neste último caso, dizem os apreciadores dessa intensidade, o objetivo é ter a sensação de “uma sobremesa líquida”. E alcoólica.
Em Tampa, a Cigar City produz anualmente a Hunahpu’s, uma Imperial Stout com 10,2% de teor alcoólico que recebe uma série de condimentos, cujo objetivo é lembrar o “mole” mexicano. A edição de 2019, servida em chope na cervejaria, apresenta notas que remetem a canela, anis, noz-moscada e gengibre, além de dulçor médio a alto e sensação alcoólica destacada – poderia ser um pouco mais contida, mas não chega a atrapalhar. Já a Yes, Always, uma Imperial Stout maturada em barril de bourbon, tem notas bastante intensas do destilado, assim como calor alcoólico forte, e poderia ser mais equilibrada para não ficar calcada apenas em uma nota, que a torna cansativa em doses maiores.
Talvez seja esse o maior desafio de quem produz Imperial Stouts maturadas em madeira e com adjuntos: o equilíbrio em meio a notas tão potentes. Sem ele, o primeiro gole pode ser um espanto – bom ou ruim, dependendo de quem toma –, mas também há o risco de saturarem-se os sentidos mais rapidamente. E como fica o resto do copo/garrafa/lata?
Especialista em Stouts, a Angry Chair, também da região de Tampa, tinha uma Imperial em chope no dia em que a visitei, coincidentemente em colaboração com a Cigar City, chamada Special Socks. Ela recebeu lactose, avelã, café e baunilha. A avelã e a baunilha apareciam com bastante destaque, assim como o aquecimento alcoólico, que, contudo, ainda ficou dentro de um limite de percepção interessante, e o conjunto agradou. Ao menos foi minha sensação ao consumir um copo pequeno. A busca pelas Imperial Stouts da Angry Chair é tão grande – muitas acabam sendo revendidas em um “mercado paralelo” – que algumas garrafas só podem ser compradas para consumo no local, o que também é uma tarefa complexa para quem não está em grupo.
Em Saint Petersburg, o taproom da Cycle Brewing também tem boas surpresas para quem é fã de Imperial Stouts. A Rare Dos 1 Year, como sugere o nome, passou mais de um ano em barril de uísque. Os 11% de teor alcoólico e a presença do destilado são bem percebidos, mas não chegam a desagradar, pois sua intensidade fica ligeiramente abaixo das notas de chocolate, café e baunilha, e o dulçor médio a alto é atenuado pelo final seco e com notas de malte torrado. É uma cerveja bastante boa, mas um copo pequeno foi, digamos, o momento ideal de encerrar a noite.
No dia seguinte, provei ainda uma das cervejas da marca, pertencente à série Stryke, em que outros produtores são convidados a fazer receitas colaborativas; no caso, a também norte-americana Bottle Logic, em uma Imperial Stout com framboesa, baunilha e cacau. Novamente, notas potentes de álcool – tem 13,5% –, cacau, framboesa e baunilha. Com um avião de volta ao Brasil a apanhar em algumas horas, achei melhor não forçar a mão. Trouxe na mala uma garrafa de outra Imperial Stout da marca, com café, manteiga de amendoim e maturada em barril de bourbon, que certamente será compartilhada, diante da impossibilidade física deste que escreve em sorver mais de 600 ml de uma cerveja de 13,5%.
Reside aí um dos méritos de cervejas com tamanha intensidade: estimular o contato entre os apreciadores por meio do consumo em conjunto. Afinal, há um bom tempo a bebida é conhecida, também, como um “lubrificante social” para tempos difíceis.
*O jornalista viajou a convite de Visit Florida