O indonésio Rudy Kurniawan, condenado a dez anos de prisão, além da multa, por falsificar vinhos antigos

Por Suzana Barelli

O indonésio Rudy Kurniawan foi condenado nesta quinta-feira 7, em Nova York, a 10 anos de prisão pela falsificação de vinhos nos Estados Unidos. Ele também deverá pagar US$ 28,4 milhões a sete de suas vítimas e mais US$ 20 milhões em multa. A condenação já era esperada, mas o tempo da pena e os valores das multas surpreenderam o mercado de vinho, de acordo com o site da revista norte-americana Wine Spectator.

Kurniawan ficou conhecido por oferecer safras antigas de vinhos franceses, principalmente de Bordeaux e de Borgonha, e vendê-las em leilões e para colecionadores particulares de vinho. Ele foi preso em 2012, mas as investigações sobre as suas atividades começaram em 2008. Naquela data, ele suspendeu, de última hora, um leilão na Acker, Merrall & Condit, no qual lotes de borgonhas antigos seriam vendidos. Entre os vinhos estavam garrafas do Clos de la Roche 1929, da Domaine Ponsot, mas este tinto só foi lançado a partir da safra de 1934. Foi o próprio proprietário da maison, Laurent Ponsot, que alertou para a fraude.

A condenação de Kurniawan deve servir de exemplo neste segmento de vinhos raros. Com a chegada de novos consumidores de bom poder aquisitivo, principalmente da Ásia, a procura por safras antigas é crescente. E muitos destes vinhos simplesmente já foram consumidos. A vontade de prová-los e de exibir seus rótulos para os amigos abre espaço para quem vende gato por lebre.

OBS: Na edição 39 da revista IstoÉ Platinum, eu escrevi uma reportagem sobre esta história que, alias, vai virar um filme. Confira:

Platinum

Verdadeiro ou falso?

Tudo indica que a falsificação de vinhos ainda não chegou ao Brasil, mas ela chegará e é bom saber como se proteger

Por Suzana Barelli

A história de uma garrafa do Château Lafite 1787, que teria pertencido a Thomas Jefferson, e que foi vendida por US$ 156 mil, é a base do livro “O vinho mais caro da história”. Os mesmos lances surpreendentes de como uma garrafa valiosa pode ser falsificada devem aparecer em “Sour Grapes”, película inspirada na ambição do indonésio Ruby Kurniawan, que começa a ser filmada ainda neste semestre. Recheadas de detalhes sobre estes vinhos ícones e o universo dos colecionadores de rótulos raros, os dois casos mostram que a falsificação da bebida, principalmente as de safras antigas, é uma realidade. Há quem estime que mais de 70% dos vinhos antigos vendidos em leilões são falsos, num dado impossível de ser comprovado.

Os leilões de vinho são o canal mais procurado para quem quer escoar estas garrafas. Em geral, são falsificações muito bem feitas, difíceis de serem detectadas sem abrir a garrafa. “É um trabalho de profissional, que mesmo os especialistas não conseguem reconhecer a fraude”, afirma o leiloeiro Renato Moysés que vem se especializando em vender vinhos no Brasil. No caso de Rudy Kurniawan, a fraude só foi descoberta porque ele tentou vender safras que não existem. O indonésio colocou em leilão a safra 1929 do Clos de la Roche da Domaine Ponsot, quando este tinto só começou a ser elaborado em 1934. O próprio proprietário, Laurent Ponsot, foi quem alertou para a fraude. Aqui, conhecer bem a história da vinícola ajuda a não levar gato por lebre.

Mas não é apenas este cuidado necessário. Com o crescimento destes leilões – estimativa da revista Vanity Fair é que US$ 478 milhões foram arrecadados nos leilões de vinho em 2012, contra US$ 92 milhões no ano 2000 – , é preciso também confiar no leiloeiro. O especialista Jorge Lucki, que vem organizando venda de rótulos raros e antigos em leilões beneficentes da Childhood e da Apae, lembra que apenas duas casas de leilões, a Sotheby’s e a Christie’s têm um departamento especializado no vinho. “Eles vão atrás da história da garrafa, não apenas da pessoa que quer colocar o vinho em leilão, mas de todo o trajeto da garrafa desde quando ela saiu da vinícola”, diz Lucki.

A certeza da procedência da garrafa é a única garantia possível de sua autenticidade. E isso não é fácil de se obter, já que a elaboração de vinhos não era cercada de tantos cuidados como hoje. Safras com mais de 50 anos podem ter grafias diferentes, por exemplo, contra as mais recentes, dos grandes chateaux, que investem em holografia do rótulo e em lacres que impedem –ou, ao menos dificultem – a falsificação. E, nos vinhos raros, vale lembrar que não há pechincha ou grandes achados. Descontos nos preços destas garrafas é o primeiro indicativo de uma fraude por trás.

Os vinhos

Château Lafite Rothschild

Este premier cru classé de Pauillac, em Bordeaux, está entre os mais falsificados no mercado. Sua base é a uva cabernet sauvignon, que é meclada com pequenas porcentagens de merlot, cabernet franc e petit verdot. A safra do ano 2000, que recebeu 100 pontos do crítico norte-americano Robert Parker, é vendida por R$ 17.400, no site Vinhos Millesime

Clos de La Roche Domaine Ponsot

A inexistente safra de 1929 do Clos Saint Denis, elaborado apenas com pinot noir na Borgonha pela Domaine Ponsot, indicou que Ruby Kurniawan estava vendendo uma falsificação. Kurniawan, hoje preso e aguardando sua sentença nos Estados Unidos, também falsificou outros vinhos de Ponsot. A safra 2009 do Clos de la Roche é vendida por US$ 1.418, na Mistral