por Luciana Mastrorosa*

Bares e botecos são uma verdadeira paixão nacional. São 30 mil espalhados só entre a capital e a Grande São Paulo, de acordo com dados da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes). Cada um deles com seu próprio estilo, mas com um ponto em comum: petiscos e mais petiscos. Bolinho de bacalhau, coxinha, pasteis, caldinhos… A lista é infinita e harmoniza bem com bebidas típicas do brasileiro, como a cerveja e a cachaça.

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Caldinho de abóbora e curry

A linha “boteco de raiz”, com receitas tradicionais preparadas com maestria, parece nunca sair de moda. Pelo contrário: com a entrada cada vez maior de chefs profissionais no ramo, a tendência é que esses botequins só cresçam, principalmente em qualidade. O paulistano Sabiá, na Vila Madalena, é um bom exemplo. A chef e sócia, Graziela Tavares, é adepta da verdadeira comida de botequim, de alma caseira. “Nosso forte são os miúdos, como moela, língua. As pessoas vêm aqui por causa disso”, afirma. Além deles, os bolinhos e caldinhos marcam presença na casa, que faz a alegria de famílias inteiras nos fins de semana. “As crianças adoram o Sabiá, se sentem à vontade, gostam da comida. Todo mundo sabe que eu não uso industrializados, faço meu caldo, prefiro tudo o mais natural possível”, diz Graziela.

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A moela refogada, uma das especialidades do bar Sabiá

Uma de suas receitas de maior sucesso é a moela refogada, miúdo do frango tantas vezes desprezado. Refogada e cozida na pressão, chega à mesa acebolada, com molho, um sucesso para petiscar. O bolinho do Luiz, homenagem ao Bar do Luiz Fernandes, supertradicional na zona norte de São Paulo, é outro carro-chefe do Sabiá. Feito de carne moída, é frito por fora e ligeiramente cru por dentro, bem temperado. “Eu e meus sócios frequentávamos muito o Bar do Luiz. Esse petisco é uma homenagem ao famoso bolinho que a gente comia lá”, lembra Graziela.

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O bolinho do Luiz, de carne moída, é uma homenagem do bar Sabiá ao Bar do Luiz Fernandes, um dos redutos mais tradicionais da capital paulista

A chef assumiu a cozinha do Sabiá em 2011, quando se tornou sócia, mas o bar abriu em 2007 e funcionou até 2009, quando fechou e passou por um breve hiato até 2011. “Era um bar que eu frequentava e gostava muito. Quando virei sócia, mantive alguns clássicos que todo mundo adorava”, diz Graziela. Com sua chegada, porém, a cozinha tornou-se ainda mais cuidadosa, com grande preocupação com os ingredientes e a introdução de novos pratos e petiscos, caso do caldinho de abóbora ao curry e do festejado pastel de camarão com catupiry (confira as receitas aqui). “Eu trabalho muito no resgate das nossas coisas, tanto receitas de família, quanto da cozinha brasileira. O Sabiá é um bar que valoriza muito a nossa cultura, a gente é apaixonado pelo Brasil”, sintetiza a chef.

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Graziela Tavares, chef e sócia do bar Sabiá

A importância do petisco para o sucesso de um bar é inegável. Boteco de corpo e alma, o Original, no bairro de Moema, zona sul paulistana, foi um dos primeiros bares a valorizar o petisco tradicional, apostando em produtos de qualidade e técnica perfeita na execução. “Quando a gente abriu o Original, há 20 anos, queríamos fugir dos modismos. Tinha muito bar seguindo moda e não se preocupando com o coração do negócio, que é a boa comida e o bom atendimento”, diz Edgard Bueno da Costa, sócio da Cia. Tradicional do Comércio. O modelo fez sucesso e lançou sua própria moda, influenciando dezenas de outros estabelecimentos a promoverem um resgate do “bar verdadeiro”, como define o empresário.

Hoje, a companhia é uma máquina de lançar botecos de sucesso, como os tradicionais Pirajá e Astor, também em São Paulo. “A gente procura não parar. Temos sempre novos projetos, novos planos em mente”, diz ele. “O Original inaugurou a história dessa empresa. Na época, a gente nem sonhava com o que viria, mas é interessante que ele se chama Original e está justamente na origem de tudo”, lembra Costa. Para celebrar as duas décadas de sucesso, a casa oferece, até setembro, alguns dos petiscos que marcaram época, como a porção chamada de braca – bolinhos de mandioquinha com camarão.

O setor está tão movimentado que o tradicional concurso Comida di Buteco – criado em 2000 com o intuito de valorizar os “botecos autênticos” – inaugurou este ano sua primeira edição nacional. O grande vencedor foi eleito, no início de julho, entre os ganhadores dos 20 concursos regionais, que incluíram cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Curitiba e Belém.

O melhor boteco do Brasil é o carioca Bar do David, instalado no morro Chapéu Mangueira, no Leme. O proprietário, David Bispo, batalhou para conquistar esse espaço. “Para mim foi um reconhecimento muito forte, porque eu me identifico demais com a minha comunidade. Abracei esse bar com responsabilidade, me dediquei desde o primeiro dia”, lembra Bispo.

Desde que abriu o boteco, em 2010, Bispo já abocanhara alguns títulos importantes no concurso, mas o primeiro lugar chegou duplamente este ano, com a conquista do Comida di Buteco regional e nacional. Pescador, o profissional está acostumado a trabalhar com frutos do mar – por isso foram eles as estrelas do prato vencedor. Batizado de ressurgência, é um mix de pescados com vinagrete e feijão-fradinho. “O nome se refere tanto a um fenômeno natural que ocorre nos oceanos, quanto ao ressurgimento das favelas no Rio, que passaram de patinho feio a um importante ponto turístico”, afirma.

O pastel é outro petisco típico de bares paulistanos. No Sabiá, é recheado de camarão e catupiry, preparado pela chef Graziela Tavares
O pastel é outro petisco típico de bares paulistanos. No Sabiá, é recheado de camarão e catupiry

Nessa mesma linha, o Boteco do Murruga, vencedor deste ano do Comida di Buteco São Paulo, também chama a atenção pela simplicidade, assim como seu colega carioca. Instalado num lava-rápido na Vila Mascote, zona sul da cidade, é conhecido por servir petiscos de sotaque português, caso de seus famosos bolinhos de bacalhau e das alheiras, que costumam ser escoltados por cerveja gelada, vinhos portugueses e caipirinhas.

Para levar o primeiro lugar, o proprietário da casa, João Manuel Araújo, ficou refletindo dias a fio até chegar à fórmula vencedora. O campeão de votos é o mignonzinho 10 do Murruga, uma porção substanciosa com dez minimedalhões de filé-mignon à milanesa com bacon, escoltados por fatias de ciabata com patê de berinjela. “O critério para a criação do petisco deste ano era o preço. Imaginei que todos os donos iam fazer petiscos simples, baratos”, conta Araújo. Com isso em mente, decidiu ir na direção oposta, mas nem pensava em ganhar. “Apostei no filé-mignon, que todo mundo gosta e agrada tanto as mulheres quanto os homens. Deu certo”, comemora. Valeu a pena.

Sabiá

rua Purpurina, 370 – Vila Madalena (veja no mapa)

(11) 3032-1617 – São Paulo – SP

* Reportagem publicada na edição 209