17/10/2019 - 16:00
Por Suzana Barelli, de São Bento do Sapucaí (SP)
A vista da Pedra do Baú, um dos principais pontos turísticos de Campos do Jordão, é de tirar o fôlego. Aos 1.950 metros do nível do mar, o Baú encanta não apenas os aventureiros, que escalam até o seu topo, ou aqueles que contemplam, de longe, a sua beleza. Agora, com o perdão da licença poética, o Baú inspira também as uvas, que crescem admirando a sua paisagem.
As montanhas ao redor do Baú estão começando a abrigar também vinhedos. Um dos recentes projetos é o da Villa Santa Maria, no bairro batizado de vale do Baú, em São Bento de Sapucaí, na Serra da Mantiqueira. “A ideia do vinho nasceu do plano de tornar a propriedade também uma fonte de renda”, conta Célia Carbonari, que junto com o marido Marco lideram o projeto. Com uma casa de campo no local e o sonho de morar na região, no início dos anos 2000, o casal começou a prospectar quais atividades agrícolas lhe permitiriam viabilizar esse projeto. Nessa busca, acabaram conhecendo o pesquisador Murillo Albuquerque Regina, que lidera o estudo de condução dos vinhedos com dupla poda, a chamada poda invertida, na Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig).
Como já gostavam de vinho, decidiram experimentar e plantaram as primeiras vinhas em 2004. Foram 4 mil mudas importadas da França naquele ano, pela Vitacea, empresa que Regina fundou para fornecer mudas livres de vírus para os viticultores brasileiros. Atualmente a propriedade conta com 70 mil vinhas, as últimas plantadas em dezembro de 2018, de preferência com inclinação norte, para ter maiores horas de sol, no solo arenoso local. “Hoje, rezamos a cartilha do Murillo”, brinca Célia.
E ela não é a única. O pesquisador, que começou a ganhar fama com o projeto da Primeira Estrada, em Minas Gerais, e, logo em seguida, da Guaspari, também na Serra da Mantiqueira, atualmente assessora 12 vinhedos, divididos entre Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro. “Participei direta ou indiretamente em praticamente todos os vinhedos que empregam a dupla poda no Brasil, seja na sua instalação, seja no fornecimento de mudas”, afirma Regina.
A técnica obtém sucesso ao fazer com que a vinha, a partir de podas e de irrigação, dê frutos nos meses de inverno, quando o clima é seco, sem as chuvas, e a amplitude térmica, como é chamada a diferença de temperatura entre o dia e a noite, é maior. Essas duas características climáticas tendem a resultar em vinhos com maior complexidade. Essa é a característica da estação mais fria do ano exatamente no Sudeste brasileiro. Na região Sul, por exemplo, de invernos mais frios, essa técnica não daria certo.
Com as uvas crescendo nos vinhedos, conduzidos pelo sistema de espaldeira (vinhas enfileiradas), a primeira safra do Villa Santa Maria foi em 2009, ainda em caráter experimental, elaborada na unidade de Caldas, no sul de Minas, da Epamig, como acontece com os demais projetos de poda invertida. Os vinhos receberam o nome de Brandina, em homenagem a avó de Marco. Agora, a ideia do casal é construir a sua própria vinícola, que deve ficar pronta em 2020, e aí conciliar com o outro projeto que eles também implementaram ao lado dos vinhedos: um restaurante com vista para o Baú.
Mas o crescimento da viticultura local não está restrita à poda invertida. O projeto Entre Vinhas, conduzido por Rodrigo Veraldi, no bairro de Campista, também em São Bento do Sapucaí, aposta nos vinhedos cultivados de maneira orgânica e com a colheita realizada no verão. “Fazemos o cultivo protegido, que nos permite produzir uvas de qualidade com o mínimo de intervenção”, defende Veraldi. Ele tem três hectares de vinhedos próprios e implementou mais 12 hectares de pessoas que sonham em ter seu próprio vinho. A Pedra do Baú é, realmente, inspiradora.
Os vinhos
Na visita à Villa Santa Maria, foram degustados três vinhos. O primeiro, um chardonnay da safra de 2017, se mostrou bem típico, com notas de frutas tropicais (abacaxi), boa cremosidade e frescor.
Nos tintos, foi provado o assemblagem da safra de 2014, um corte de merlot (71%), cabernet franc (17%) e cabernet sauvignon (12%), com notas de frutas vermelhas, mescladas com baunilha e tostados, mas curto no paladar. O segundo tinto, da safra de 2013, elaborado com 63% de cabernet franc e 37% de cabernet sauvignon, estava bem interessante, com aromas de frutas vermelhas ainda frescas, taninos presentes e macios, e boa persistência. Não havia estoque do syrah, que é a aposta da casa. Os vinhos podem ser adquiridos no www.villasantamaria.com.br